[Legales] Primeiro rascunho/proposta de texto da FSFLA para a ADIn
3059
Alexandre Oliva
lxoliva en fsfla.org
Jue Mayo 11 06:31:30 UTC 2006
Segue texto que acabo de regidir. Não estou em condições de dar uma
revisada pra valer (preciso dormir), então deve ter um montão de erros
que uma passada a mais pegaria, mas como o tempo é tão curto, mando
já, pois dá pra avaliar melhor o conteúdo e ver se há algo importante
faltando.
Todas as correções e sugestões construtivas são bem-vindas e
urgentes.
------------ próxima parte ------------
Da preferência constitucional pelo Software Livre
v 0.1, 2006-05-11
Alexandre Oliva <lxoliva en fsfla.org>
Neste rascunho, ainda falo apenas por mim, embora dê a impressão de já
falar pela FSFLA. A versão final não conterá este parágrafo, e
representará a opinião da FSFLA como um todo.
A Lei n° 11.871, de 19 de dezembro de 2002, ainda que não defina
Software Livre e o utilize como sinônimo de software aberto, ficou
conhecida como Lei do Software Livre. Cumpre à FSFLA -- Fundação
Software Livre América Latina, em processo de constituição na
República Argentina, unindo-se à rede de fundações formada por FSF --
Free Software Foundation dos Estados Unidos da América, FSFE -- Free
Software Foundation Europe e FSFI -- Free Software Foundation India,
manifestar-se a respeito de incorreções conceituais presentes na lei
no tocante ao significado de Software Livre, termo cunhado pela FSF,
que, assim como suas fundações irmãs, entre elas a FSFLA, tem como
objetivo promover e defender o software licenciado sob esta
modalidade.
Cumpre à FSFLA também argumentar que, embora haja falhas na redação da
lei, seu propósito é não só compatível com a constituição, como
facilmente derivável dos princípios que estabelece para a
administração pública.
Das definições
Software Livre é definido pela FSF em seu sítio
(http://www.fsf.org/licensing/essays/free-sw.html), definição também
presente no sítio de seu maior projeto, o do Sistema Operacional GNU,
onde se encontra a tradução para português
(http://www.gnu.org/philosophy/free-sw.pt.html) que se segue, também
presente no sítio da FSFLA (http://www.fsfla.org/?q=pt/node/17)
~Nós mantemos esta definição do Software Livre para mostrar
claramente o que deve ser verdadeiro à respeito de um dado programa
de software para que ele seja considerado software livre.
"Software Livre" é uma questão de liberdade, não de preço. Para
entender o conceito, você deve pensar em "liberdade de expressão",
não em "cerveja grátis".
"Software livre" se refere à liberdade dos usuários executarem,
copiarem, distribuírem, estudarem, modificarem e aperfeiçoarem o
software. Mais precisamente, ele se refere a quatro tipos de
liberdade, para os usuários do software:
- A liberdade de executar o programa, para qualquer propósito
(liberdade no. 0)
- A liberdade de estudar como o programa funciona, e adaptá-lo para
as suas necessidades (liberdade no. 1). Acesso ao código-fonte é um
pré-requisito para esta liberdade.
- A liberdade de redistribuir cópias de modo que você possa ajudar
ao seu próximo (liberdade no. 2).
- A liberdade de aperfeiçoar o programa, e liberar os seus
aperfeiçoamentos, de modo que toda a comunidade se beneficie
(liberdade no. 3). Acesso ao código-fonte é um pré-requisito para
esta liberdade.~
Cabe esclarecer que por código fonte, refere-se ao software na forma
preferencial para se fazer modificações, escrita em linguagens de
programação compreensíveis para humanos, normalmente incluindo
documentação necessária à compreensão e manutenção do programa.
Grande parte das linguagens de programação exige a transformação dos
programas para outra forma, chamada de código objeto, mais apropriada
para execução eficiente, mas privada da documentação e da facilidade
relativa de compreensão presentes no código fonte.
Retornemos à definição de Software Livre:
~Um programa é software livre se os usuários tem todas essas
liberdades. Portanto, você deve ser livre para redistribuir cópias,
seja com ou sem modificações, seja de graça ou cobrando uma taxa
pela distribuição, para qualquer um em qualquer lugar. Ser livre
para fazer essas coisas significa (entre outras coisas) que você não
tem que pedir ou pagar pela permissão.
Você deve também ter a liberdade de fazer modifcações e usá-las
privativamente no seu trabalho ou lazer, sem nem mesmo mencionar que
elas existem. Se você publicar as modificações, você não deve ser
obrigado a avisar a ninguém em particular, ou de nenhum modo em
especial.
A liberdade de utilizar um programa significa a liberdade para
qualquer tipo de pessoa física ou jurídica utilizar o software em
qualquer tipo de sistema computacional, para qualquer tipo de
trabalho ou atividade, sem que seja necessário comunicar ao
desenvolvedor ou a qualquer outra entidade em especial.
A liberdade de redistribuir cópias deve incluir formas binárias ou
executáveis do programa, assim como o código-fonte, tanto para as
versões originais quanto para as modificadas. Está ok se não for
possível produzir uma forma binária ou executável (pois algumas
linguagens de programação não suportam este recurso), mas deve ser
concedida a liberdade de redistribuir essas formas caso seja
desenvolvido um meio de cria-las.
De modo que a liberdade de fazer modificações, e de publicar versões
aperfeiçoadas, tenha algum significado, deve-se ter acesso ao
código-fonte do programa. Portanto, acesso ao código-fonte é uma
condição necessária ao software livre.
Para que essas liberdades sejam reais, elas tem que ser irrevogáveis
desde que você não faça nada errado; caso o desenvolvedor do
software tenha o poder de revogar a licença, mesmo que você não
tenha dado motivo, o software não é livre.
Entretanto, certos tipos de regras sobre a maneira de distribuir
software livre são aceitáveis, quando elas não entram em conflito
com as liberdades principais. Por exemplo, copyleft (apresentado de
forma bem simples) é a regra de que, quando redistribuindo um
programa, você não pode adicionar restrições para negar para outras
pessoas as liberdades principais. Esta regra não entra em conflito
com as liberdades; na verdade, ela as protege.
Portanto, você pode ter pago para receber cópias do software GNU, ou
você pode ter obtido cópias sem nenhum custo. Mas independente de
como você obteve a sua cópia, você sempre tem a liberdade de copiar
e modificar o software, ou mesmo de vender cópias.
"Software Livre" Não significa "não-comercial". Um programa livre
deve estar disponível para uso comercial, desenvolvimento comercial,
e distribuição comercial. O desenvolvimento comercial de software
livre não é incomum; tais softwares livres comerciais são muito
importantes.
Regras sobre como empacotar uma versão modificada são aceitáveis, se
elas não acabam bloqueando a sua liberdade de liberar versões
modificadas. Regras como "se você tornou o programa disponível deste
modo, você também tem que torná-lo disponível deste outro modo"
também podem ser aceitas, da mesma forma. (Note que tal regra ainda
deixa para você a escolha de tornar o programa disponível ou não.)
Também é aceitável uma licença que exija que, caso você tenha
distribuído uma versão modificada e um desenvolvedor anterior peça
por uma cópia dele, você deva enviar uma.
No projeto GNU, nós usamos "copyleft" para proteger estas liberdades
legalmente para todos. Mas também existe software livre que não é
copyleft. Nós acreditamos que hajam razões importantes pelas quais é
melhor usar o copyleft, mas se o seu programa é free-software mas
não é copyleft, nós ainda podemos utilizá-lo.
Veja Categorias de Software Livre
(http://www.gnu.org/philosophy/categories.html) para uma descrição
de como "software livre", "software copyleft" e outras categoria se
relacionam umas com as outras.
Às vezes regras de controle de exportação e sansões de comércio
podem limitar a sua liberdade de distribuir cópias de programas
internacionalmente. Desenvolvedores de software não tem o poder para
eliminar ou sobrepor estas restrições, mas o que eles podem e devem
fazer é se recusar a impô-las como condições para o uso dos seus
programas. Deste modo, as restrições não afetam as atividades e as
pessoas fora da jurisdição destes governos.
Quando falando sobre o software livre, é melhor evitar o uso de
termos como "dado" ou "de graça", porque estes termos implicam que a
questão é de preço, não de liberdade. Alguns temos comuns como
"pirataria" englobam opiniões que nós esperamos você não irá
endossar. Veja frases e palavras confusas que é melhor evitar para
uma discussão desses termos. Nós também temos uma lista de traduções
do termo "software livre" para várias línguas.
Finalmente, note que critérios como os estabelecidos nesta definição
do software livre requerem cuidadosa deliberação quanto à sua
interpretação. Para decidir se uma licença se qualifica como de
software livre, nós a julgamos baseados nestes critérios para
determinar se ela se segue o nosso espírito assim como as palavras
exatas. Se uma licença inclui restrições impensadas, nós a
rejeitamos, mesmo que nós não tenhamos antecipado a questão nestes
critérios. Às vezes um requerimento de alguma licença levanta uma
questão que requer excessiva deliberação, incluindo discussões com
advogados, antes que nós possamos decidir se o requerimento é
aceitável. Quando nós chegamos a uma conclusão sobre uma nova
questão, nós frequentemente atualizamos estes critérios para tornar
mais fácil determinar porque certas licenças se qualificam ou não.
Se você está interessado em saber se uma licença em especial se
qualifica como uma licença de software livre, veja a nossa lista de
licenças. Se a licença com a qual você está preocupado não está
listada, você pode nos questionar enviando e-mail para
<licensing en gnu.org>.
Mais textos para ler
Outro grupo iniciou o uso do termo software aberto para significar
algo próximo (mas não idêntico) a "software livre". Nós preferimos o
termo "software livre" porque, uma vez que você tenha aprendido que
ele se refere à liberdade e não ao preço, você se preocupará com a
questão da liberdade.~
Como se vê, Software Livre não tem significado idêntico a software
aberto, ainda que a lei tenha definido software aberto de forma muito
distinta de sua definição original
(http://www.opensource.org/docs/definition.php), mas sim de forma
semelhante ao início da definição de Software Livre. A lei deixa de
definir Software Livre, mas não deixa de utilizar o termo, criando a
dúvida se pretende que se o entenda como sinônimo de software aberto
ou de acordo com sua definição pela FSF.
Em certas passagens da lei parece ser a intenção o uso dos termos como
sinônimos; em outras, parece-se tentar fazer distinção entre os temos,
como no Artigo 3°, II, que diz ~programa livre e/ou código de fonte
aberto~, termos comumente utilizados como sinônimos para Software
Livre e para software aberto, respectivamente.
O uso dos dois termos com intenção de sinonímia na lei, ainda que com
significados levementes distintos, representa um risco teórico de que,
sendo criada uma licença que atenda à definição de Software Livre mas
não a de software aberto, ou vice-versa, seja estabelecido um vácuo
legal em que não se justificar a preferência ou a não preferência por
software licenciado sob tais termos.
A lei falha mais gravemente, porém, ao exigir que a licença ~não
restrinja sob nenhum aspecto da cessão, distribuição, utilização ou
alteração de suas características originais~, condição que reduz a
quantidade de softwares licenciados em termos compatíveis à definição
da lei a praticamente zero. Mesmo as licenças mais liberais de
Software Livre, tais como a licença do X11, do MIT e a BSD revisada,
exigem ao menos a preservação das linhas de Copyright, restando apenas
licenças desconhecidas nas comunidades de Software Livre, tão liberais
que não imponham qualquer restrição, ou software que já tenha caído em
domínio público e tenha seu código fonte disponível.
Como a lei 9609/98 estabelece que direito autoral sobre software
vigora por 50 anos e software existe há pouco mais que isso, faz
sentido supor que a lei não se tenha escrito com objetivo de que o
poder público privilegiasse a minúscula quantidade de software
desenvolvida nos primórdios da computação eletrônica, em detrimento de
toda a indústria de software que floresceu desde então.
Cremos que faça mais sentido entender que houve falha na redação da
definição de software aberto na lei, e portanto contestamos a
definição presente na lei, em desacordo com o uso comum do termo, e
sugerimos a interpretação do termo presente na lei através do
significado na definição de Software Livre.
É certo que a FSFLA não se posicione favoravelmente à lei, visto que
cria confusão e dúvidas a respeito dos termos Software Livre e
software aberto e, por causa da definição incorreta, restringe seu
efeito prático a zero e, pior, iguala as categorias de Software Livre
e software não-livre (doravante, proprietário), ainda que, conforme
vamos argumentar, a escolha do Software Livre atenda muito melhor aos
princípios constitucionais estabelecidos para a administração pública.
Antes de proceder à argumentação sobre a obrigação constitucional de
dar preferência ao Software Livre, cabe esclarecer uma dúvida comum no
tocante à viabilidade econômica do Software Livre.
Entende-se por software comercial aquele desenvolvido com propósito de
lucro. Negócios baseados no comércio de licenças de software são
bastante comuns, porém mais comuns ainda são os negócios baseados em
serviços associados ao software. A imensa maioria do software
desenvolvido no Brasil e no mundo não é software de prateleira, mas
sim software desenvolvido especificamente para um determinado usuário.
Em alguns casos, quem desenvolve o software é o próprio usuário; em
outros, o usuário contrata um prestador de serviços para
desenvolvê-lo, negociando quem manterá a titularidade dos direitos
autorais sobre o software resultante. Caso a titularidade permaneça
com o desenvolvedor, faz-se necessária a escolha de termos de
licenciamento para que o contratante possa fazer uso do software,
conforme artigo 9° da lei 9609/98.
Nada impede que o desenvolvedor eleja termos compatíveis com a
definição de Software Livre para sua licença, e mesmo assim exija
remuneração pelos serviços de desenvolvimento, controle de qualidade,
empacotamento, distribuição que prestou, assim como pela oferta de
garantia que venha a oferecer.
Da mesma forma, quem desenvolve software com finalidade de oferecê-lo
a um mercado maior, licenciando inúmeras cópias do software a
múltiplos compradores de licenças, pode eleger termos compatíveis com
a definição de Software Livre para o licenciamento.
Ainda que licenças de Software Livre exijam a ausência de ônus para o
exercício das liberdades por ela concedidas, dentre elas a de copiar e
distribuir o software, com ou sem modificação, o titular do direito
autoral, não estando sujeito às restrições da licença, pode exigir
remuneração não só pelos serviços de cópia e distribuição, mas também
pelo próprio ato do licenciamento do software a seus clientes.
Conquanto permita a qualquer de seus clientes a distribuição do
software a terceiros, licenciando-lhes o software sem ônus, não há
violação dos preceitos do Software Livre.
Concluímos daí que não há óbice ao lucro mediante licenciamento
através de termos compatíveis com a definição de Software Livre. Pelo
contrário, a definição foi criada de modo a estimular o livre comércio,
não necessariamente de licenças, mas de serviços de desenvolvimento,
suporte, treinamento, adaptação, entre outros.
De fato, enquanto o software proprietário fomenta um livre comércio
somente até o momento em que um usuário opta por uma determinada
alternativa, entrando a partir daí num monopólio em que depende
exclusivamente do fornecedor escolhido para obter eventuais adaptações
ou correções necessárias ao software.
No caso do software livre, não só o fornecimento do software está
sujeito à livre concorrência, mas também o fornecimento de suporte,
incluindo nele adaptações ou correções.
Tal concorrência só é possível por ser o usuário livre para distribuir
o software na forma de código fonte para um eventual candidato a
concorrente de seu fornecedor original, ato que concede ao potencial
concorrente as liberdades de estudar e modificar o software e de
distribuir o resultado das modificações de volta ao usuário. Nada na
definição de Software Livre impede o concorrente de ser remunerado por
esses serviços.
Estabelece-se assim a livre concorrência em torno de um mesmo
software, prevalecendo os concorrentes que ofertarem a seus clientes a
melhor relação custo/benefício, sendo o usuário livre para trocar de
fornecedor ou contratar funcionários para suporte interno, sem receio
de ter de arcar com custos e dificuldades de migração para softwares
não completamente compatíveis, que no caso do software proprietário
muitas vezes envolvem a necessidade de conversão entre formatos de
arquivos proprietários não documentados.
Da preferência pelo Software Livre
Através dos princípios da economicidade, eficiência, transparência,
soberania e impessoalidade, que a constituição estabelece para a
administração pública, vamos argumentar que a constituição já exige a
preferência pelo Software Livre.
A liberdade n° 0 do Software Livre, que permite a execução do software
para qualquer propósito, não dá margem à prática de cobrança de
licenças por computador, por processador, ou por unidade
administrativa, tão comuns aos software proprietário. Como
conseqüência, não se faz necessário ao poder público proceder a
licitações a cada vez que se fizer necessário utilizar o software em
novos computadores. A economicidade e a eficiência não são atendidas
apenas pela ausência de ônus pelo licenciamento múltiplo: a própria
necessidade de licitação para o licenciamento é normalmente
dispensável para o Software Livre, já que a licença pode
freqüentemente ser obtida sem ônus, dispensando o processo licitatório
para a aquisição das licenças.
Some-se a isso a liberdade n° 2 do Software Livre, que permite ao
poder público distribuir o Software Livre licenciado para todos os
seus cidadãos e outros órgãos de outras esferas do poder público, e a
eficiência de investimentos no sentido de obter Software Livre
mostra-se muito maior que a de licenciar software proprietário, mesmo
nos casos em que o investimento necessário para se obter uma licença
de um Software Livre possa ser maior.
A liberdade n° 1 do Software Livre, que permite o estudo do
funcionamento do software, é essencial para garantir a soberania do
poder público. Na ausência do código fonte, faz-se impossível
verificar que o software proprietário faça o que se propõe a fazer,
nem mais nem menos: fica-se completamente à mercê de abusos que
fornecedores possam escolher cometer, por decisão própria ou
exigências de governos estrangeiros, confiando na dificuldade de
detecção de desvios. Com a possibilidade de inspecionar o código
fonte e, mais do que isso, de executar código objeto criado a partir
do código fonte inspecionado, reduz-se o risco de tais abusos, já que
a dificuldade de detecção cai.
A liberdade n° 1, associada à liberdade n° 2, garante a transparência,
na medida em que permite ao poder público distribuir o software, na
forma de código fonte e objeto, a qualquer cidadão que o solicite.
Outra faceta da liberdade n° 1, que concede liberdade para adaptar o
software, é essencial para a economicidade e a soberania.
Utilizando-se software proprietário, se o fornecedor se recusa a
efetuar uma adaptação necessária ao poder público, o único recurso
passa a ser a contratação do desenvolvimento de um novo software que
contemple as necessidades, possivelmente desperdiçando todo o
investimento já feito no software anterior. No caso do Software
Livre, o poder público pode efetuar a adaptação internamente, ou se
valer da liberdade n° 2 para contratar os serviços de adaptação de
terceiros, preservando o investimento anterior.
Para preservar os princípios constitucionais discutidos anteriores em
face da possibilidade de alteração do software pelo próprio poder
público, faz-se necessária em adição à liberdade n° 2 a n° 3, do
contrário não seria possível distribuir o software modificado.
Embora não seja tema tratado pelas leis em questão, vale mencionar que
a distribuição de software por parte do poder público também deveria
se dar, via de regra, na forma de Software Livre, não só para atender
ao princípio da transparência, mas também da economicidade, permitindo
que pessoas físicas e jurídicas contribuam voluntariamente para o
melhoramento do software, dispensando o poder público de pelo menos
parte dos investimentos necessários a satisfazer as necessidades dos
cidadãos. Argumentos apresentados anteriormente de que tal
licenciamento, se oferecido sem ônus a toda pessoa física e jurídica,
representaria improbidade administrativa ou favorecimento indevido,
não nos parecem razoáveis, já que a impessoalidade não é violada
quando a todas as pessoas físicas e jurídicas é ofertada a mesma
possibilidade de lucro.
A combinação das liberdades n° 1 e n° 2, no que tange à possibilidade
de modificações do software pelo próprio poder público ou por
terceiros, é justamente o que favorece o Software Livre no que diz
respeito ao princípio da impessoalidade.
Quando o poder público adquire software proprietário, não só se coloca
à mercê do fornecedor no que diz respeito a serviços de
desenvolvimento de adaptações, mas também ao suporte num sentido mais
amplo, ou seja, a decisão por licenciamento de um software
proprietário implica um favorecimento ao fornecedor em quaisquer
serviços de suporte subseqüentes relacionados ao software.
Justificativas de padronização de adoção do software também favorecem
ao mesmo fornecedor, um favorecimento incompatível com a
impessoalidade que se exige do poder público.
A adoção de Software Livre pelo poder público, por outro lado, permite
que, a cada serviço que se faça necessário relacionado ao software,
tome-se uma decisão sobre qual fornecedor contratar para prestá-lo.
Qualquer pessoa física ou jurídica pode se qualificar para prestar o
serviço, independendo de autorização do fornecedor original para ter
acesso ao código fonte que viabiliza a manutenção e a aquisição de
conhecimento sobre o software. É o máximo respeito à impessoalidade.
Alegações de que a preferência pelo Software Livre violam a
impessoalidade são falaciosas, baseadas na premissa falsa de que a
possibilidade de licenciamento em termos que respeitem as liberdades
de seus usuários não estão disponíveis para determinados fornecedores
de software. Pelo contra~io, qualquer fornecedor que tenha se
colocado em situação que o impossibilite de oferecer seu software em
licença livre, tais como o uso de software proprietário de terceiros
como parte de seu software, o fez de livre e espontânea vontade,
ciente de que essa restrição seria um fator limitante para seus
clientes e para si mesmo, não restando argumento razoável contra a
preferência pelo Software Livre implícita na constituição.
Das leis que dão preferência ao Software Livre
Como demonstramos, a constituição estabelece princípios para a
administração pública que conduzem à escolha do Software Livre.
Há de se concordar que, ainda que a evidência seja clara uma vez
formalizados os argumentos, a compreensão da mecânica do Software
Livre não é facilmente acessível a mentes treinadas para um mercado
baseado no modelo de licenciamento proprietário.
Esse é o contexto em que surgem leis como a do RS, propostas por
alguns poucos que compreenderam a dimensão da violação constitucional
em andamento e buscaram, através de uma formalização mais direta dos
pensamentos aqui expostos, corrigir essa distorção e colocar o poder
público, pelo menos nas esferas a que tinham acesso, em cumprimento
dos princípios constitucionais.
Ainda que muitas dessas leis tenham cometido o mesmo erro de definição
que a lei do RS de que trata este processo, praticamente anulando seus
efeitos jurídicos, serviram e servem ao propósito de nortear as
decisões de aquisição de software por parte das diversas esferas do
poder público a que se aplicam, mesmo porque muitos dos tomadores de
tais decisões não atentaram para o erro da definição e/ou seguiram o
espírito das leis, já que a letra equivocada das leis as tornava
inoperantes.
Tais leis, da forma como definem Software Livre, não nos parecem
compatíveis com os preceitos constitucionais para a administração
pública, cabendo portanto argumentação sobre sua constitucionalidade.
Se, por outro lado, utilizassem a definição correta, com os argumentos
aqui expostos, parece-nos que seria difícil argumentar contra sua
constitucionalidade, visto que apenas codificariam de forma mais
imediata o que a constituição já codifica de forma indireta.
Sugerimos e pedimos, pois, aos poderes capazes de corrigir ou revisar
tais leis a fim de utilizar a definição correta, que o façam.
Até que isso ocorra, ainda que muito nos desagrade a definição
equivocada de Software Livre, utilizando o termo similar e menos
apropriado software aberto, o que nos leva a nos posicionarmos
publicamente contra a lei, nosso desagrado obviamente não serve como
justificativa para considerar a lei inconstitucional.
Embora não tenhamos abordado dois dos argumentos contrários à
constitucionalidade da lei, não nos parece que a lei regule
licitações, já que sugerem a adoção de software licenciado sem ônus,
dispensado portanto de licitação, nem que haja reserva de iniciativa
aos legislativos estaduais ou municipais para determinar preferências
de âmbito econômico.
Alexandre Oliva
Secretário
Fundação Software Livre América Latina
A cópia fiel e exata do conteúdo deste documento é permitida em
qualquer meio, desde que esta nota seja preservada.
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