[Legales] [Ada Lemos] projeto de lei sobre licenciamento livre no
Brasil
Alexandre Oliva
lxoliva en fsfla.org
Dom Oct 8 07:33:07 UTC 2006
Segue primeiro rascunho de resposta ao pedido de comentários sobre o
projeto de lei. Que lhes parece? Devo traduzir para inglês para
facilitar a plena compreensão?
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Prezado Sr José de Souza Pennafort Neto,
Excelentíssima Senadora Serys Slhessarenko,
Vimos por meio desta manifestar alguns receios e tecer alguns
comentários a respeito do projeto de lei de direito autoral que
regulamenta o licenciamento livre.
O Art 30-B proposto para a lei 9610 estabelece condições para o uso da
obra licenciada de forma livre e seu inciso II proíbe o uso
comercial. Parece-nos que seria mais adequado para com o caput do
artigo garantir positivamente o uso não comercial, reservando ao
titular do direito autoral a possibilidade de permitir ou não o uso
comercial.
Cabe argumentar que a possível proibição de uso comercial conflita com
a compreensão corrente de licenciamento livre, a exemplo do termo
Software Livre, que exige permissão de uso comercial. A proibição de
uso comercial descaracteriza o Software como Livre. O uso do mesmo
termo `livre' com tal possibilidade de restrição pode causar confusão
e prejuízo ao nosso movimento, pelo que sugerimos ou a remoção do
óbice ao uso comercial ou a adoção de outro termo, baseado na noção de
'commons' subjacente à proposta.
Ainda que nos cause satisfação observar propostas de lei inspiradas em
tendências derivadas de princípios do Software Livre, causa-nos também
certo receio a provisão explícita em lei de modalidades de
"licenciamento livre." É nosso entendimento que tais modalidades já
sejam previstas implicitamente em lei, o que torna as novas provisões
redundantes, exceto por nomearem a modalidade de licenciamento com
propósito de utilizar a definição no artigo 2º do projeto de lei.
Nosso receio a esse respeito é de que, caso o projeto de lei não seja
aprovado, surjam ainda mais receios infundados com relação à
legalidade do licenciamento de Software Livre, tanto no direito
privado quanto no direito público.
Ao mesmo tempo, a provisão explícita remove alguns receios com relação
ao direito público, em que argumentos baseados no princípio da
legalidade são levantados contra a disponibilização de Software Livre
pela administração pública.
Parece-nos que talvez fosse mais apropriado manter as definições de
"licenciamento livre" no próprio projeto de lei, ao invés de
introduzi-los como modificação à lei de direito autoral, já que são
redundantes com a lei pré-existente e fazem sentido apenas no contexto
do próprio projeto de lei.
Causa-nos certa estranheza a limitação da provisão do Art 2º a obras
musicais. Parece-nos que a justificativa se aplica igualmente a
outras formas de expressão, de que trata a lei de direito autoral,
tais como obras literárias e software.
Reconhecemos que a aplicabilidade do Art 30-B fica bastante limitada
no caso do software proprietário, uma vez que normalmente se faz
necessário o código fonte para a criação de obras derivadas.
De fato, tal distinção entre software e outras formas de expressão não
é nova. No ordenamento jurídico atual, mesmo de um software em
domínio público não se podem de fato criar obras derivadas, em função
da falta de código fonte.
Por essa razão, propomos e defendemos (não necessariamente no contexto
deste projeto de lei) a exigência de disponibilização de código fonte
ou seu registro como condições para a aplicabilidade do direito
autoral sobre uma peça de software. Sem essa exigência, software pode
não cumprir o propósito original do direito autoral, o de enriquecer o
domínio público mediante o incentivo à criação através de concessão de
monopólio temporário de exploração da obra.
A provisão do Art 2º do projeto de lei é condicionada à não reedição
da obra por um período de 10 anos. Ao mesmo tempo em que a provisão
parece um passo correto no sentido de viabilizar o uso livre de obras
não mais exploradas comercialmente, temos receios com relação ao
significado de reedição, tanto no contexto da Internet quanto no
pré-Internet, não só com relação à música mas também a outras formas
de expressão:
- A oferta de download, comercial ou gratuito, de uma mesma gravação
de uma música ao longo do tempo caracteriza permanente reedição, ou é
necessário que ocorra um download de fato para caracterizar a
reedição?
- Caso uma gravação original não seja reeditada por 10 anos, mas se
edite uma nova gravação de uma música durante esse período, derivada
ou não da original, a gravação original passa a estar sujeita aos
termos de licenciamento livre, ainda que em tese não se exija o
licenciamento livre da composição musical, em função de sua edição
noutra gravação?
- A mesma dúvida se aplicaria a obras literárias, se o projeto de lei
a elas se aplicasse. Uma mera reimpressão caracteriza reedição, ou se
fazem necessárias modificações do conteúdo para reiniciar o prazo de
10 anos sem reedição?
- Caso o projeto de lei venha a se aplicar a software, questionamentos
similares também se aplicam: a publicação (edição?) de uma nova versão
de um software estende o prazo de 10 anos de uma versão anterior? A
disponibilização de correções ou atualizações tem o mesmo efeito?
Talvez convenha, a fim de evitar as dúvidas acima, alterar o final do
Art 2º para: um prazo de 10 anos sem que a obra, ou obras dela
derivadas, tenham sido editadas ou publicadas.
Vale ainda manifestar nosso repúdio ao uso do termo "propriedade
intelectual" na justificativa do projeto de lei. Esse termo é uma
tentativa de abarcar conceitos inteiramente díspares, governados por
leis completamente diferentes, de forma a induzir a aceitação da
legitimidade de cada uma delas através da falácia da propriedade sobre
o intangível, ao invés de exigir que cada um dos dispositivos que
regula o intangível seja legitimado de maneira independente como
benéfico à sociedade.
Essa objeção é argumentada em maior profundidade em
http://www.gnu.org/philosophy/not-ipr.xhtml, infelizmente ainda sem
tradução para português no Brasil. Como a justificativa do projeto de
lei está embasada exclusivamente na noção de direito autoral,
sugerimos substituir a generalização imprópria por esse termo
específico.
Sem mais, manifestamos nossos protestos de estima e consideração,
Alexandre Oliva, ...?
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Sobre a FSFLA...
------------ próxima parte ------------
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