Já pensou o Galvão Bueno no Big Brother Brasil? Vinte e quatro horas por dia, 366 dias por ano bissexto de exposição pessoal e Cala a Boca pra salvar o pássaro Galvão e as criancinhas! Puta falta de sacanagem! Pois é bem isso que o Congresso Nacional está tramando. Tudo bem que vai corrigir uma confusão que o programa de TV criou, mas AI (5.0) é que mora o perigo!
Sabe?, sempre me perturbou o Pedro Bial chamar de Big Brother o pessoal que expõe sua privacidade no programa de TV. Tá errado! O Big Brother original, aquele do livro de George Orwell, é quem monitora tudo que os habitantes “da casa” fazem. A TV conseguiu convencer um monte de gente não só de que essa exposição é desejável, como de que monitorar é divertido e aceitável. AI (5.0), já viu, né?
Enquanto ainda morre gente de fome, apesar de tanta bala perdida, bancos e grandes editores de música e filmes pressionam os supostos representantes do povo e os supostos defensores da justiça por um suposto combate aos supostos crimes supostamente cibernéticos. AI (5.0), não tarda aparecer alguém pronto a receber financiamento de campanha para promover retrocessos sociais.
Aproveitam-se da comoção popular quando se fala em terrorismo, em crimes hediondos, em pedofilia. “Precisamos monitorar todas as conexões da Internet porque há maus caracteres pervertidos procurando fotos e filmes de jovens e crianças sem roupa! Precisamos desconectar os criminosos que emprestam livros, discos e filmes a seus amigos através da Internet, porque assim deixarão de atacar navios em alto mar! Precisamos proibir a privacidade de comunicação, porque há terroristas planejando atentados com seus telefones portáteis!” AI (5.0), é só torcer para ninguém colocar as coisas em perspectiva lembrando de criminosos e terroristas famosos como Mandela e Gandhi.
Pensando bem, nem precisa ir a outros continentes. Na América Latina, várias ditaduras suprimiram com violência as liberdades essenciais de associação, de comunicação, de movimento, até de viver, com o pretexto de se defenderem de ameaças ao regime. Felizmente, não contavam com os recursos tecnológicos de que dispomos hoje: câmeras de segurança, monitores de tráfego na Internet, rastreadores celulares com microfones e câmeras, controlados e acionáveis à distância. AI (5.0) fica a pergunta: conseguiriam Mandelas e Gandhis de hoje enfrentar um Estado Tecnopolicial?
Como trocariam informação se as câmeras em locais públicos registrariam encontros suspeitos e até os encontros fora do alcance de câmeras de segurança podem ser registrados através do acionamento remoto dos telefones-cela? Como se não bastasse, poderiam ser condenados e presos por enquadramento no Art 285-B do AI 5.0: divulgar informação que o Estado armazena em computadores sujeitos a expressas restrições de acesso, porque quer escondê-la do público. Pelo mesmo artigo, poderiam também ser condenados por usar redes de telefonia ou a Internet para planejar manifestações contrárias às imposições do Estado totalitário, após o Estado estabelecer, nos detalhes do regulamento do então já aprovado AI 5.0, a exigência de vedação contratual a esse tipo de atividade. Já o Art 285-A do AI 5.0 permitiria o enquadramento por utilizarem identificações compartilhadas para acessar essas redes de telecomunicações, numa tentativa de burlar o monitoramento individual imposto pelo Estado. Sem falar que, conforme regulamentação futura do AI 5.0 (já que, na própria lei, a sociedade não aceitou), para se conectar à rede telefônica e à Internet precisariam dar o Cadastro Único. E AI (5.0), dá pra notar como estariam fora de ação, perdidos, se já não houvessem desistido por ficar com o Cadastro Único na mão?
Ah, mas poderiam recorrer ao papel, com cartas legítimas disfarçando informação “terrorista” escrita com suco de limão, como fizeram prisioneiros políticos na Índia; deixar sinais insuspeitos nos muros, no asfalto, em livros de bibliotecas públicas, não? Não, seriam enquadrados pelos mesmos artigos, tão ridiculamente amplas são as definições no Art 16 do AI 5.0 de dispositivos de comunicação, sistemas informatizados e redes de computadores. Mas, "péra" AI (5.0), será que precisamos nos preocupar com isso tudo, uma vez que vivemos num Estado Democrático de Direito?
Até que ponto é democrático, quando os representantes correm para aprovar com urgência projetos de lei como o AI 5.0, que privilegiam cada vez mais alguns poucos, apesar de criminalizarem atos corriqueiros praticados pela maioria que supostamente os elegeu? Escrevo supostamente porque as possibilidades de comprovação de fraudes eleitorais em larga escala vêm sendo progressiva e paulatinamente removidas por aqueles que controlam o processo eleitoral e as urnas e que, hoje, podem escolher sozinhos os eleitos, sem qualquer possibilidade de detecção, quanto mais prova de fraude, e a suposta justiça condena, por litigar de má fé, quem tenta exigir judicialmente a correção das vulnerabilidades do sistema. Mas AI (5.0), nem precisa de um sistema eleitoral corrupto pra chegar a um estado totalitário, basta lembrar que um certo Hitler chegou ao poder total na Alemanha com grande apoio da maioria da população.
Quer dizer, não estamos imunes à possibilidade de que alguém abuse dos mecanismos democráticos para chegar ao poder e, em seguida, mantê-lo, inclusive parecendo manter o regime democrático. Com poucos escrúpulos e alguma habilidade no uso de armas de distração em massa, terrorismo e pedofilia se tornam fabulosos meios para promover leis que garantam ao Estado Tecnopolicial a possibilidade de vigiar e controlar todo mundo, inclusive o Galvão Bueno. E AI (5.0), ai de quem ousar enfrentar esse poder para tentar restaurar as liberdades civis!
O pior é que vai ter gente contente. Afinal, a gente se sente muito melhor depois de um “Cala a Boca, Galvão!” Mas de falar isso na Internet ou na frente da TV a efetivamente censurar alguém, a diferença é grande. Com o apelo do terrorismo, da pedofilia e do “Cala a Boca, Galvão”, muita gente acaba sacrificando bens maiores por uma sensação de conforto e segurança. AI (5.0), vibram ante a aprovação de leis que sujeitam Galvão Bueno e todos nós à censura, à vigilância e à exposição, tornando todos nós participantes de um imenso Big Brother Brasil.
Se deixarmos isso chegar a acontecer, não vamos ficar ricos nem famosos. Não posaremos, vestidos ou pelados, na capa de grandes revistas. Não poderemos nem reclamar à direção do programa, nem ao Pedro Bial. Estaremos vigiados, controlados e monitorados e presos numa casa imensa, da qual não poderemos sair, nem abandonando o programa. De acordo com os preceitos democráticos, se não nos manifestarmos, teremos voluntariamente deixado tudo isso acontecer e depois não poderemos mais nos manifestar. E AI (5.0), vamos deixar?
Até blogo...