Errar é humano, insistir no erro é com supremo, com tudo!
Hoje, o supremo tribunal federal (em minúsculas, mesmo, já que o tribunal se apequenou ainda mais) confirmou a autorização para prisão ilegal de inocentes.
Explico.
A constituição federal (hoje apequenada pelo stf) determina, em seu artigo 5º:
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
Ora, o requerente do Habeas Corpus hoje julgado não tem contra si qualquer sentença penal condenatória transitada em julgado, portanto ainda não pode ser considerado culpado, conforme o dispositivo constitucional citado.
Quando autoriza prisão de alguém que não pode ser considerado culpado, não se tratando de prisão provisória, autoriza prisão de inocente.
Ah, mas a constituição e o código de processo penal autorizam tais prisões!, argumentaria alguém desavisado ou raivoso. De fato, devo reconhecer que tal prisão não feriria a constituição federal, em seu artigo 5°:
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
Bastaria, para atender a tal dispositivo, que uma autoridade judiciária competente assinasse ordem escrita e fundamentada.
Restam dúvidas, ainda a serem julgadas, quanto à competência do juiz de primeira instância para julgar processo que naturalmente recairia sob noutra vara, que atraiu para si sob a premissa de que teria relação com processo já sob sua jurisdição, mas que na sentença condenatória reconheceu não ter confirmado tal relação. Não poderia, portanto, assinar a ordem de prisão do processo, que sequer tinha competência para julgar.
Não nos atenhamos, porém, a esse ponto, que ainda será analisado por tribunais superiores. Retornemos à questão hoje pautada, recorrendo, outrossim, ao que estabelece o código de processo penal:
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.
O grifo não é meu, é da ministra rosa weber, em seu voto. Realçou que, caso fosse sobre a questão objetiva, decidiria em sentido diverso, porém, tratando-se de habeas corpus subjetivo, isto é, a respeito de um indivíduo, acompanharia a decisão colegiada anterior, de 2016, em que primeiro se autorizou a prisão não provisória de inocentes.
A lei é para todos, exceto na exceção.
Ora, ante o artigo 283 do código de processo penal, fica evidente que tal decisão, de 2016, tratou-se de erro, já que tal prisão não-provisória, por não atender ao requisito da sentença condenatória transitada em julgado, é ilegal. Mas, ao invés de corrigir o erro, o supremo nele insiste. Um supremo erro.
De onde se deveria esperar justiça e segurança no cumprimento das leis, o que fica evidente é o arranjo para adiar o julgamento das questões objetivas, das Ações Diretas de Constitucionalidade, para então, com a desculpa da urgência regimental do habeas corpus, julgá-lo, como tribunal canguru de exceção, sob o estreito prisma de questão subjetiva, conforme arrisquei prever em 22 de março:
.oO a contrariedade de Gilmar Mendes me dá medo de que, para julgar o Habeas Corpus de Lula, tenha rolado um acordo com supremo, com tudo, pra "votarem" de acordo com o entendimento de 2016, sem revisitar o mérito como exigiriam as ADCs pendentes
Longe de atacar rosa weber, pretendo aqui denunciar mais um passo do golpe, através desse acordão para, cedendo à pressão dos plutocratas, burlar a necessária revisão do mérito e reforçar a permissão para que se faça a injustiça prendendo ilegalmente um inocente.
Note que não sou eu afirmando ser ilegal tal possibilidade de prisão não provisória. É o próprio plenário do supremo tribunal federal que o faz, não só de forma explícita, na voz de rosa weber e dos meritíssimos ministros que ousaram contrariar a pressão plutocrata, mas de forma implícita, ao se recusarem, individual e coletivamente, a pautar a votação das ADCs que, já se sabia e veio a se confirmar no voto de rosa weber, uma vez julgadas, reverteriam a decisão vigente desde 2016.
Ainda causa-me espanto, porém, que o supremo tribunal federal tão descarada e escancaradamente viole não apenas o código de processo penal, mas a própria constituição que tem por obrigação interpretar e guardar. Digo que a violaram hoje, sim, pois assim estabelece o mesmo artigo 5º da constituição federal:
LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
Ao não conceder o habeas corpus preventivo, mesmo sinalizando o conflito com a lei e a divergência da presente decisão da que ocorreria em caso objetivo, submete o impetrante, em caráter de exceção, à ameaça iminente de ordem de prisão não provisória ilegal, violando o dispositivo acima que exigia a concessão do habeas corpus. Violaram a lei e a constituição todos os que armaram e votaram em contrário.
Resta saber se, uma vez efetivada a violência, novo habeas corpus, já não mais preventivo, será impetrado junto ao supremo tribunal federal, e se os ministros, ora engambelados pelo acordão para o julgamento de hoje, lograrão rever a questão objetiva do mérito e fazer valer outro dispositivo do mesmo artigo da tão golpeada constituição cidadã:
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
Façam suas apostas! Ficarão os golpistas satisfeitos com a prisão por poucos dias do favorito para as eleições, o único que, ao contrário dos demais, não perderia em segundo turno para o eternamente candidato mas nunca antes eleito Sr Nulo Branco? Ou crêem os golpistas precisar, para ter alguma chance nas eleições (se é que as teremos), que ele seja trancafiado e mantido incomunicável para que não possa participar nem mesmo indiretamente do processo eleitoral?
Não importa sua cor favorita, nem se você prefere cefalópodos vivos ou fritos. Se a lei que assegura o direito de Francisco vira obstáculo a ser contornado no caso específico de Chico, acabou-se o estado de direito, acabou-se a razão de existir do judiciário.
Jazem aqui, sob esta cláusula pétrea, direitos individuais da constituição federal, golpeada e atropelada no trânsito (em julgado) por 6 autos 4/4 errantes, que se ausentaram da cena do crime sem prestar socorro.
Fica doravante outorgada a dita "dura democracia, com supremo, com tudo".
PS: não coloquei enlaces para as leis, que costumavam estar disponíveis livremente no site do poder executivo federal, porque agora o site exige a violação da lei para quem quiser conhecer a lei. Para mostrar a lei, as páginas exigem a execução de um trecho de código Javascript sem sequer licença de uso. Segundo a lei de software, execução de software sem licença nem nota fiscal de compra é contra a lei. Além do mais, isso é software privativo de liberdade, e ninguém merece o oposto de Software Livre. Mas tenho uma pergunta importante que não quer calar: por que motivo o governo federal resolveu dificultar o acesso ao texto das leis federais?
Comente aqui, aqui, aqui ou nas redes P2P Twister e SSB-Patchwork.
Atualizado: os parágrafos contendo "lei é para todos" e "cor favorita" e os links para comentar foram adicionados (e depois corrigidos) após a publicação inicial; além disso, erros de formatação foram corrigidos e o PS acima foi adicionado.